Quarentena cultural

Revista Época
29.03.2020

LUIZA MUSSNICH

Poeta

Em tempos de quarentena, eu poderia sugerir obras de títulos engraçadinhos, como Enclausurado, do Ian Mc Ewan, ironias como Encontro marcado, do Fernando Sabino, distopias muito reais, como “Ensaio sobre a cegueira”, do José Saramago e para curtir o lar, como “As durações da casa”, da Julia de Souza”. (Todas, aliás, excelentes recomendações de livros).

Mas escolhi, tanto na recomendação do livro, como do filme, histórias de personagens mulheres e suas perdas abruptas. Para mim, a sensação generalizada é mesmo de perda: de rotina, de atividades coletivas, de planos de curto e médio prazo, de produtividade, de convívio social, de confraternização.

A normalidade esvaiu-se, e nos restou tempo para compulsórias reflexões: que pensemos no coletivo e nas nossas escolhas individuais. O livro “O ano do pensamento mágico”, da americana Joan Didion, fala principalmente sobre a velocidade e imprevisibilidade com que as coisas mudam. A não ficção de Didion trata justamente do fato de nunca estarmos preparados para acontecimentos drásticos. A vida acontece bruscamente.

Em “A liberdade é azul”, primeiro filme da trilogia de Krzysztof Kieslowski, o diretor trabalha a liberdade, um dos três conceitos da Revolução Francesa, sob o espectro da cor azul — cor da melancolia, do medo, do desejo — para subverter a crença de que ela é ilimitada e facilmente alcançável.